Nos últimos anos, a indústria alimentícia tem investido muito no desenvolvimento de pesquisas sobre tecnologias alternativas para limpeza e higienização não-residuais com o objetivo de melhorar a segurança dos alimentos. A eficácia do ozônio na limpeza física, química e biológica em unidades de processamento de alimentos tem sido relatada em diversas pesquisas científicas no Brasil e no exterior. Sua vantagem está na rápida inativação microbiana e menor consumo de água e energia durante o processo.

A limpeza pode ser definida como a remoção de carga orgânica (por exemplo, resíduos de alimentos e microrganismos) das superfícies de contato com os alimentos, para que fiquem visualmente limpas, não contaminem os alimentos, não tenham odores ruins e não sejam gordurosas ao toque. Por outro lado, a higienização garante que uma superfície limpa esteja substancialmente livre de microrganismos patogênicos e um número aceitável (porém indesejável) de microrganismos deteriorantes.

Os procedimentos de limpeza e higienização de superfícies usados ​​na indústria de alimentos devem garantir a destruição ativamente as células vegetativas de microrganismos perigosos e reduzir substancialmente o número de outros microrganismos indesejáveis ​​sem afetar adversamente a qualidade do produto ou sua segurança para o consumidor.

Assim, como acontece com uma solução clorada usada na desinfecção de superfícies, a eficiência do processo está diretamente relacionada com a concentração de cloro diluído. Na água ozonizada acontece da mesma forma, e uma boa desinfecção necessita de uma grande concentração de ozônio dissolvido compatível com os microrganismos-alvo.

O interesse das indústrias em ter programas de limpeza e sanitização altamente eficazes não é somente para atender a legislação, mas principalmente, garantir a não contaminação cruzada de alimentos durante o processo de produção, uma vez que as empresas devem implantar e manter procedimentos de higiene baseados na análise de perigos e princípios de ponto crítico de controle como parte de seus requisitos para a segurança alimentar.

Limpeza e Higienização de superfícies tradicional

Antes do início de qualquer processo de limpeza é necessário conhecer previamente as características do resíduo e da superfície a ser limpa. A etapa de limpeza na indústria de alimentos tem como objetivo a remoção dos resíduos orgânicos e minerais das superfícies.

O processo de limpeza de superfícies na indústria de alimentos varia de acordo com as características físicas e químicas de cada tipo de sujidade. O processo de higienização depende da preparação das superfícies em questão. Algumas indústrias preferem fazer uma limpeza mecânica “a seco”, com raspagem e, às vezes, aspiração.

Limpeza e higienização de superfícies - esquema do microbolha

A maioria dos desinfetantes deve ser aplicada em superfícies livres de matéria orgânica e resíduos de limpeza. A ordem de eventos geralmente recomendada é:

pré-lavagem >>  lavagem  >> enxaguar  >>  higienização  >>  enxaguar

Sendo assim, a maioria das indústrias, iniciam o processo com uma pré-lavagem com água que tem a função de remover 90% da sujidade presente na superfície.

O detergente utilizado na etapa de lavagem precisa ser apropriado para o tipo de resíduo. Por exemplo, os detergentes alcalinos removem com maior eficiência os resíduos à base de gorduras, proteínas e açúcares, enquanto que os resíduos à base de minerais necessitam de detergentes ácidos.

Os carboidratos são facilmente removidos na limpeza já as gorduras e proteínas e sais minerais são mais resistentes a remoção e necessitam as vezes de uma ação mecânica com mais atenção. Felizmente, os agentes de limpeza modernos são misturas de componentes químicos versáteis que podem tratar vários tipos de sujidades. Na sequência é feito o enxague com água para remover os resíduos e também o detergente usado na remoção.

Depois de concluída a limpeza da superfície, os agentes sanitizantes são necessários para higienizar as superfícies. Os agentes sanitizantes mais comuns incluem cloro e seus derivados, derivados de iodo, ácido peracético, peróxido de hidrogênio e quaternário de amônia.

O tratamento térmico pode ser eficaz na destruição de microrganismos, mas o custo energético associado ao desenvolvimento de vapor e água quente é alto e o calor excessivo pode ser prejudicial a alguns alimentos, superfícies e equipamentos. Por outro lado, os métodos de desinfecção químicos são mais econômicos e os produtos, como o cloro, são amplamente utilizados na indústria de alimentos, devido ao baixo custo de aquisição e a sua capacidade de inativar todos os tipos de células vegetativas.

O cloro é o desinfetante mais comum dos desinfetantes e germicidas usados pela indústria de alimentos. A necessidade de melhorias nestes processos de limpeza e desinfecção promove um alto consumo de água e produtos químicos nos processos de sanitização dos ambientes aumentando a umidade nas indústrias de alimentos e a atividade água criando condições para a proliferação de microrganismos.

Os compostos de cloro são germicidas de amplo espectro que atuam nas membranas microbianas, inibem as enzimas celulares envolvidas no metabolismo da glicose, têm efeito letal no DNA e oxidam as proteínas celulares. O cloro tem atividade em baixa temperatura, é relativamente barato e deixa um mínimo de resíduo ou película nas superfícies.

No entanto, as principais desvantagens também estão associadas ao alto consumo de água e aos subprodutos do cloro, tais como serem corrosivos para muitas superfícies como pisos de concreto e superfícies de metal (especialmente em temperaturas mais altas), eles também podem causar problemas de saúde e segurança devido à irritação da pele e podem causar danos à membrana mucosa em áreas confinadas.

Além disso, sob certas condições, o cloro pode formar derivados orgânicos clorados, alguns dos quais são os trihalometanos potencialmente cancerígenos (THMs). Embora existam riscos associados à formação de compostos cancerígenos a partir do cloro que sejam de interesse público, não existem muitos outros desinfetantes químicos adequados disponíveis com uma gama tão ampla de ação microbiana como o cloro.

Limpeza e Higienização de superfícies com água ozonizada

A indústria deve examinar as questões específicas do uso da água ozonizada quando aplicada como parte de um regime de limpeza na indústria de alimentos. A eficácia química e microbiológica não depende somente da compra e instalação do equipamento gerador de ozônio, mas também a forma de incorporação do ozônio na água (difusores, venturis ou geradores de microbolha), características químicas da água, distância entre o tanque de preparação e o ponto de consumo. A partir do momento em que o ozônio é gerado ele começa a reagir com metais e matérias orgânicas presentes na água, material do tanque de oxidação e tubulação que levam a água até o ponto de consumo. Quando a indústria está instalada em uma região que possui água dura, é necessária a instalação de filtros abrandadores com resinas capazes de remover a dureza da água. Estes filtros devem ser instalados na entrada da água no tanque de oxidação onde a água ozonizada será preparada.

Projeto de instalação da estrutura para preparação da água ozonizada

Em uma indústria de alimentos, principalmente em pequenas empresas é muito comum o uso de um único reservatório central usado para atender diversos objetivos: bombeiro, sanitários, refeitório, cozinhas, jardins, produção, tratamento de efluentes e lavagem de pátios e veículos.

O tempo de meia-vida do ozônio em água é curto. Por isso, a água ozonizada deve ser gerada no momento da aplicação. Em uma indústria de alimentos o gerador de ozônio deve funcionar garantindo a produção da água ozonizada, onde, o reservatório onde ocorrerá a oxidação funciona como um tanque pulmão garantindo um volume de água ozonizada para atender a demanda da indústria.

A instalação de um sistema de tratamento de ozônio no reservatório principal, além de cara, é desnecessária. É recomendável a instalação de um reservatório de água exclusivo onde será preparado a solução de água ozonizada. Este reservatório é conhecido por “tanque de oxidação” e deverá estar de acordo com o projeto do sistema que será dimensionado em cima da vazão, concentração de ozônio desejado, capacidade de produção do gerador de ozônio, a forma de incorporação escolhida e a concentração de ozônio dissolvido desejado.

O primeiro passo é levantar os dados sobre o volume de consumo de água no horário de pico e sua sazonalidade de consumo durante o expediente de trabalho. O equipamento de ozônio é dimensionado em cima da avaliação por parte de um fabricante de gerador ou empresa de instalação experiente que avaliará os seguintes dados:

  1. tamanho do tanque de oxidação (em m³);
  2. vazão de água no horário de maior consumo (em m³/hora);
  3. temperatura da água (em °C);
  4. PH da água;
  5. concentração de ozônio desejada (mg/L).
  6. distância entre o tanque e o ponto de consumo.

Com estas informações o fabricante deverá construir um gerador de ozônio compatível com o sistema de incorporação que garanta a concentração de ozônio diluído desejada. Após a instalação o fabricante deverá calibrar e demonstrar a concentração projetada para o cliente contratante.

Processo de inativação de microrganismos

As propriedades bactericidas do ozônio devem-se principalmente ao fato de ser um poderoso oxidante, por isso tem sido considerado um substituto do cloro na higienização antimicrobiana de água, alimentos e superfícies e equipamentos de processamento de alimentos. No uso prático, o ozônio se decompõe em uma série de radicais livres de meia-vida de nano-segundos, que podem atacar compostos orgânicos indiscriminadamente, não deixando nenhum componente residual e quando a decomposição está completa se degrada em oxigênio.

Embora o ozônio tenha um amplo espectro antimicrobiano, sua eficácia depende do microrganismo alvo. Por exemplo, no caso das bactérias, embora os resultados sejam variados na literatura, pode-se presumir que as bactérias Gram-negativas são mais sensíveis à ozonização do que as Gram-positivas e que o ozônio é mais eficaz contra células bacterianas vegetativas do que contra bactérias e esporos de fungos.

O ozônio higieniza ao interagir com as membranas microbianas e desnaturar as enzimas metabólicas não deixando resíduo químico. Uma vantagem do ozônio é sua capacidade de oxidar prontamente os micróbios em solução. Como o ozônio não requer armazenamento ou manuseio especial ou considerações de mistura, ele pode ser visto como vantajoso em relação a outros desinfetantes químicos.

Quanto ao uso do ozônio na forma gasosa, estudos sobre sua eficiência e eficácia na desinfecção de superfícies de aço inoxidável são relatados na literatura. Moore et al. (2000) descobriram que as aplicações de ozônio tiveram menos sucesso quando biofilmes secos estavam presentes na superfície de contato com alimentos. Os autores concluíram que o ozônio pode ser mais eficaz, portanto, na desinfecção de superfícies de contato com o produto, que normalmente devem ser limpas várias vezes ao dia, ao invés de superfícies ambientais, como paredes, que precisam ser limpas apenas uma vez por semana. Estudos comprovaram que um alto nível de esterilização bacteriana é possível com o ozônio gasoso. Eles descobriram que os níveis de inativação tinham fortes paralelos com a ozonização em meio aquoso; no entanto, uma alta UR é necessária.

Outra forma de limpar equipamentos de processamento de alimentos é pulverizando água ozonizada diretamente sobre pisos, ralos, paredes, equipamentos úmidos, tanques (externa ou internamente) e salas limpas por meio de um sistema móvel ou centralizado com pulverizadores manuais, suspensos ou de baixa pressão. Tais sistemas são especialmente adequados para limpeza de equipamentos fora do local e sistemas de limpeza com ozônio contendo água têm sido empregados com sucesso dessa forma tanto para a indústria de laticínios quanto para a de produtos frescos.

Isso significa que o ozônio é um agente oxidante muito potente que inativa prontamente os microrganismos em soluções aquosas. As aplicações do ozônio como tecnologia de higienização também podem incluir a esterilização de superfícies de ambientes de processamento de alimentos contaminados, câmaras frias, esteiras, tanques, tubulações e equipamentos, etc.

O ozônio deve suas excelentes atividades bactericidas, virucidas e esporicidas às suas poderosas propriedades oxidantes. Em procedimentos de sanitização na indústria de alimentos, o ozônio é geralmente usado em uma solução aquosa. A presença de componentes orgânicos resultará na autodestruição do ozônio e na redução da eficácia biocida. Por este motivo a concentração de ozônio diluído na água deve ser sempre alta, se o objetivo for substituir desinfetantes químicos.

A eficácia do procedimento de limpeza e higienização de superfícies com água ozonizada é composta de um conjunto de variáveis ​​como temperatura, pH e quantidade de matéria orgânica. Em relação à temperatura, é amplamente aceito que a taxa de inativação de microrganismos com qualquer desinfetante aumenta com o aumento da temperatura. No entanto, quando o ozônio é usado como desinfetante na água, conforme a temperatura aumenta, o ozônio também se torna menos solúvel e menos estável.

Portanto, há um valor limite de temperatura em que a ozonização é mais eficaz, que é significativamente menor do que as temperaturas típicas de saneamento. O ideal é que a água esteja com uma temperatura menor que 40°C. Por outro lado, em alguns casos o aumento da reatividade do ozônio pode compensar a diminuição de sua estabilidade com o aumento da temperatura do meio. Em relação ao pH, o ozônio é mais estável em pH baixo do que em pH alto, mas em pH mais alto o ozônio se decompõe, com os radicais produzidos aparentemente aumentando sua eficácia. Portanto, o pH real necessário deve ser condicionado pelo microrganismo alvo.

Finalmente, algumas das substâncias orgânicas que estão presentes no meio aquoso de ozônio podem competir com os microrganismos pelo ozônio. Portanto, a menos que ozônio adicional seja adicionado para compensar essa perda potencial, a eficácia do processo de higienização com ozônio pode ser reduzida. Água limpa sem matéria orgânica é desejável para uso na higienização de equipamentos de processamento de alimentos com ozônio.

A cinética de desinfecção do ozônio no ar em baixa umidade relativa (UR) pode ser ordens de magnitude mais lenta do que em meio aquoso. Embora o ozônio não reaja significativamente com a água ou o ar na ausência de radiação ultravioleta (UV), sob irradiação UV o ozônio reage com a água e se decompõe em vários radicais de vida curta, como o radical hidroxila altamente reativo. Evidências teóricas e empíricas sugerem que a maior parte do efeito da esterilização resulta dos radicais produzidos, e não do ozônio em si. A reação de decomposição pode ser aumentada no ar pelo uso de irradiação UV e por meio de umidade controlada.

Teoricamente, portanto, os efeitos do ozônio no ar, sob condições controladas, devem ser paralelos aos efeitos do ozônio na água, e a eficácia do ozônio na eliminação de patógenos transportados pelo ar em qualquer meio pode ser comparável a alta UR.

As concentrações mínimas nas quais o ozônio inativa vírus e bactérias na água são notavelmente baixas. Por exemplo, o limite para Escherichia coli está entre 0,1 e 0,2 ppm. Os vírus também são sensíveis a baixos níveis de ozônio, uma vantagem para um sistema baseado no ar, uma vez que esses pequenos micróbios são especialmente difíceis de remover por filtração.

Embora o ozônio tenha um amplo espectro antimicrobiano, sua eficácia depende do microrganismo alvo. Por exemplo, no caso das bactérias, embora os resultados sejam variados na literatura, pode-se presumir que as bactérias Gram-negativas são mais sensíveis à ozonização do que as Gram-positivas e que o ozônio é mais eficaz contra células bacterianas vegetativas do que contra bactérias e esporos de fungos. Em outro estudo, foi descoberto que a água contendo ozônio não era eficaz na desinfecção de superfícies de contato com alimentos na presença de proteínas e, consequentemente, recomendaram uma limpeza eficiente antes de usar água contendo ozônio para fins de desinfecção.

Segurança na aplicação em superfícies

A água ozonizada é extremamente segura para o ser humano. Um cuidado que deve sempre ser tomado é que o processo de injeção e incorporação garanta que o ozônio não saia na forma gasosa nos pontos de consumo.

O processo de incorporação deverá ser realizado em um tanque de incorporação, necessariamente fechado com um respiro interligado a um destruidor de ozônio para garantir com que o gás ozônio não incorporado no meio aquoso seja inalado por alguma pessoa. O gás ozônio, mesmo em baixas concentrações (∼0,1 mg/L) pode causar irritação no nariz, garganta e olhos, e a exposição de uma hora a concentrações de ozônio de 2, 4, 15 e 95mg/L induz sintomas, irritação, tóxicos e letais irreversíveis efeitos, respectivamente, em humanos.

A saúde e a segurança dos funcionários devem sempre ser priorizadas durante o projeto e instalação para evitar acidentes e processos trabalhistas. A NR15 do Ministério do Trabalho regulamenta a dosagem máxima permitida de 0,08ppm de ozônio para pessoas em ambientes de trabalho com 44 horas semanais.

Algumas empresas instalam detectores gás ozônio próximos aos ozonizadores e tanques de oxidação. Além disso, deve haver planos para ações corretivas em caso de acidentes, procedimentos de resposta à inalação acidental de ozônio e treinamento de pessoal cobrindo a natureza e os perigos do ozônio, precauções e primeiros socorros para a inalação de ozônio.

A escolha de um profissional experiente para projetar e orientar a instalação são de importância primordial no sucesso e segurança da instalação.

 

Vivaldo Mason Filho Diretor da myOZONE

Vivaldo Mason Filho é Administrador de Empresas e Especialista em Análise de Sistemas pela PUCCAMP, Especialista e Mestre em Engenharia pela USP. Empresário e especialista na implantação de ozônio para indústrias de alimentos. Atuou por 11 anos como Professor nos cursos de graduação e pós-graduação de Administração, Comércio Exterior e Engenharia de Produção. É atual vice-presidente da Associação Brasileira de Ozônio – ABRAOZÔNIO.

 

 

 

O HACCP é uma sigla internacionalmente reconhecida para Hazard Analysis and Critical Control Point ou Análise de Perigos e Controlo de Pontos Críticos.

Atividade água: em termos práticos, é a água do alimento que vai reagir com microrganismos (e também participar de outras reações, como as enzimáticas). Quanto mais elevada for a “atividade água”, mais rápido os microrganismos (como bactérias, leveduras e bolores) serão capazes de se multiplicar; logo seu controle está diretamente relacionado com a conservação dos alimentos. (FOOD SAFETY BRAZIL, 2016)