O controle de insetos em grãos armazenados com o uso do gás ozônio tem se mostrado uma alternativa a uso do gás fosfina, por ser um poderoso agente oxidante. Investigações científicas apontam o gás ozônio como uma alternativa sustentável e mais segura para controle de pragas em grãos armazenados. O gás ozônio apresenta um comportamento difusivo através de meios porosos constituídos de grãos.
Quando em contato com a massa de grãos o transporte do gás ozônio ocorre em duas fases:
- Num primeiro momento há uma degradação rápida do ozônio e
- Posteriormente esta taxa de degradação reduz de forma que o gás percorra através da massa de grãos atingindo os insetos.
O tempo de meia-vida do gás ozônio no ar é de 20-50 minutos, e este tempo é reduzido quando em contato com grãos. Devido ao tempo de meia-vida curto em condições ambientes o ozônio deve ser aplicado no próprio local onde é gerado.
Na área de armazenamento e processamento de grãos a maior parte dos estudos científicos publicados relativos à aplicação do gás ainda é em nível de laboratório e simulação computacional. Isto se deve principalmente pelo tamanho das instalações comerciais de armazenamento de grãos, o que torna oneroso a realização de experimentos.
O ozônio tem sido eficiente no manejo de pragas, quando transportado através da massa de grãos por meio de movimentação forçada de ar, os efeitos da exposição dos grãos de trigo, arroz, soja e milho de pipoca ao gás ozônio na concentração de 50 ppmv por um período de 30 dias em caixas plásticas de 0,025 m3. Na base destas caixas foram instaladas telas metálicas para sustentação dos grãos e formação de um plenum para melhor distribuição do gás ozônio. Neste estudo foi constatado que a velocidade de reação do gás ozônio com os grãos é diretamente proporcional à velocidade intersticial do ar que está transportando o gás. Nas condições de tratamento o gás ozônio não alterou os parâmetros de qualidade dos grãos.
A geometria de equipamentos e instalações industriais para aplicação do gás ozônio para desinfestação de alimentos armazenados não é nenhum desafio. A estrutura mínima necessária é composta por:
- fonte de oxigênio;
- gerador de ozônio industrial;
- câmara hermética de tratamento podendo ser um container, câmara de lona ou silo metálico.
O primeiro passo é garantir a segurança das pessoas, por isso a aplicação deve sempre ser realizada em local hermético. Após o tratamento, um período deve ser aguardado para que o ozônio seja degradado, antes da abertura da câmara de tratamento.
Se o objetivo da empresa é substituir o tratamento tradicional com gás fosfina pelo ozônio, o tratamento pode ser aplicado da mesma forma que o gás fosfina. Mas, é muito importante entender que as dosagens e tempos de exposição usados por muitas empresas possuem baixo coeficiente de letalidade. A FAO (Food and Agriculture Organization) dos EUA e o próprio Ministério da Agricultura brasileiro afirmam que a dosagem de fosfina recomendada para fumigação de alimentos com um coeficiente de letalidade de 50% da população de insetos possui dosagem em média de 3g/m³.
Diversas pesquisas científicas já demonstraram que o ozônio quando aplicado na dosagem e tempo de exposição corretos atingem coeficiente de letalidade bem maior que o gás fosfina. Porém o ozônio é um gás. E, assim como todo fumigante, funcionará se atingir a superfície tratada. Devido a isso, produtos a granel com granulometrias maiores são mais fáceis de tratar do que produtos embalados.
A Tabela abaixo mostra alguns dos insetos comuns em grãos e a respectiva taxa de mortalidade sob tratamento com ozônio. O estágio de vida dos insetos influencia a toxicidade do ozônio. Foi verificado através de experimentos que as pupas são mais vulneráveis ao ozônio do que os ovos e larvas de P. interpunctella a 70 mg/L por 4 dias. Resultados semelhantes foram documentados quando a mortalidade total foi obtida em todas as fases da vida do inseto, exceto ovos (131 mg/L por 8 dias). Isso pode ser atribuído à camada externa dos ovos, que prova ser uma barreira mecânica ao ozônio. Foi documentado em 2019, que o estágio adulto de C. maculatus é menos tolerante ao ozônio (500 ppmv para 274,40 min de exposição necessários para matar 90%), enquanto o estágio mais tolerante é a pupa (500 ppmv para 1.816,54 min é necessário para matar 90%). Assim, para garantir o controle total das pragas de insetos, o tempo de exposição ao ozônio deve ser prolongado para as fases imaturas.
Controle de insetos em grãos armazenados: lista de insetos e nível de mortalidade
Grãos | Insetos alvos | Concentração do Ozônio | Tempo de exposição | Mortalidade | Referência |
Grão armazenado | Duas espécies de Tribolium spp. (Coleoptera: Tenebrionidae) | 45 ppmv | ≥6.5 h | 100% | Erdman (1980) |
Mistura de farinha/ fubá de milho | Oryzaephilus surinamensis (L) | 5 ppm | 3 e 5 dias | 100% | Mason, Woloshuk e Maier (1997) |
Grãos armazenados | Tribolium confusum Tribolium castaneum e Sitophilus zeamais (Adulto) | 50 ppmv | 3 dias | 100% | Mason et al. (1999) |
Milho | T. castaneum (TC) Sitophilus zeamais (SZ) P. interpunctella (PI) | 25 ppmv | 5 dias | 91,4% (TC) 99,9% (SZ) 77,0% (PI) | Kells et al. (2001) |
Milho | Adulto- T. castaneum, Adulto- S. zeamais, e Larva– P. interpuntella | 50ppmv | 3 dias | 92-100% | Kells et al. (2001) |
Milho | Sitophilus zeamais. | 50 ppm de ozônio (8 L min-1) | 48 h | 100% | Faroni, Pereira e Sousa (2007) |
Milho | Adultos de S. zeamais e T. castaneum | 50 mg kg −1 | 23,76 e 64,19 h | 95% | Rozado et al. (2008)
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Trigo | Sitophilus oryzae (L.) – adultos | 25 e 50 ppmv | 4 e 2 dias | 100% | Bonjour et al. (2008) |
Trigo | Tribolium castaneum-adultos | 70 ppmv. | 4 dias | 100% | Bonjour et al. (2011)
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Trigo | Ovos de P. interpunctella, S. zeamais-adulto e S. oryzae-adulto | 1800 ppm | 180, 120 e 60 min | 100% | McDonough, Mason e Woloshuk (2011) |
Trigo | Ephestia kuehniella (EK) e Tribolium confusum (TC) | 13,88 mg/L | Tratamento de liberação de ozônio com intervalo de 30 min por 5 h | 90-100% (L, P e A de EK) 72,6% (L) 1,3-22,7% (E, P e A de TC) | Isikber e Oztekin (2009) |
Feijão-caupi | Adultos de Callosobruchus maculatus | 500 ppmv | 274,40 min | 100% | Pandiselvam et al., 2019 |
Pupa | 1.816,54 min | 100% | |||
Mortalidade de insetos em produtos armazenados | T. castaneum R. dominica O. surinamensis | 50 ppm | 11,39–20,10 h (TC) 9,22–12,19 h (RD) 6,1–9,66 h (OS) | 50% | Sousa et al. (2008) |
T. castaneum (TC) R. Dominica (RD) O. surinamensis (OS) | 22,17-37,9 h (TC) 21,85-35,17 h (RD) 11,03-18,72 h (OS) | 95% |
Um bom tratamento depende muito do conhecimento que se tem do produto, avaliar a situação e escolher a melhor técnica para fumigação. Algumas técnicas de aplicação ajudam na busca por resultados melhores.
Variáveis que poderão interferir no controle de insetos em alimentos armazenados
- Granulometria do produto tratado (ex: grãos, flocos, folhagens e pó). Quanto maior o espaço intergranular menor será a resistência de penetração do gás ozônio. Um trigo com casca é mais fácil de tratar do que farinha de trigo.
- Porosidade do material. Cada produto agrícola possui uma porosidade. Produtos muito porosos consumirão o gás ozônio não só na sua superfície, mas também, no interior do grão. Produtos muito porosos consomem uma quantidade maior de gás do que produtos com menor porosidade.
- Concentração do gás (mg/L ou ppm). Assim como ocorre em outros fumigantes, a eficiência do tratamento com o ozônio está diretamente relacionada com a concentração. Quanto maior a concentração de ozônio, maior será a mortalidade dos insetos.
- Volume de massa tratada (kg) – taxa de utilização da estufa. Quanto maior o volume de massa tratada, maior quantidade de ozônio será necessário. Outro ponto importante é o que chamamos de taxa de utilização da estufa. Deixar um espaço vazio dentro da estufa é uma excelente alternativa, pois melhora a dispersão do gás na câmara resultando em um tratamento melhor.
- Tamanho do gerador. Cada gerador possui uma capacidade de produção (g/h). Quanto maior for a produção do equipamento mais rápido o resultado será alcançado.
- Tempo de tratamento. O tempo de exposição é importante durante o tratamento. Quanto maior o tempo de exposição, melhores serão os resultados.
- A temperatura da câmara de tratamento também interfere nos resultados dos tratamentos. O ozônio possui tempo de meia-vida muito curto quando exposto em temperaturas superiores a 40°C.
- Tipo de embalagem (Ráfia, Juta, Papel Kraft – 2 camadas kraft + polipropileno e saco de polipropileno) O Ozônio assim como o gás fosfina é um gás. Uma embalagem com menor barreira física facilita a penetração dentro da sacaria aumentando a eficiência do tratamento.
- Atmosfera modificada “vácuo” dentro da câmara. O processo resume-se em uma câmara hermética preparada para o vácuo. Após carregada a câmara, uma bomba de vácuo retira uma quantidade de ar antes de injetar o ozônio. Principalmente em produtos embalados, o tratamento em câmaras de vácuo fazem toda a diferença e melhoram muito os resultados.
Vivaldo Mason Filho é Administrador de Empresas e Especialista em Análise de Sistemas pela PUCCAMP, Especialista e Mestre em Engenharia pela USP. Empresário e especialista na implantação de ozônio para indústrias de alimentos. Atuou por 11 anos como Professor nos cursos de graduação e pós-graduação de Administração, Comércio Exterior e Engenharia de Produção. É atual vice-presidente da Associação Brasileira de Ozônio – ABRAOZÔNIO.